Perda auditiva e o impacto na qualidade de vida

O que é perda auditiva e como ela pode prejudicar o bem estar

A perda auditiva é uma diminuição na habilidade de ouvir, resultando na incapacidade de ouvir determinados sons e compreender a fala. Pode ser congênita ou adquirida e acontecer em qualquer momento da vida, de forma gradual ou súbita e em qualquer parte do ouvido, seja orelha externa, média ou interna.

Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde) 10% da população mundial apresenta algum grau de perda auditiva. No Brasil, os estudos apontam em torno de 30 milhões de pessoas com perda auditiva.

Entre as dificuldades relacionadas à perda auditiva encontramos dificuldade em ouvir determinados sons, como canto do passarinho, barulho do despertador, barulho da chuva; aumentar o volume da televisão; dificuldade para acompanhar conversas em ambientes ruidosos; dificuldade na comunicação com outras pessoas como familiares, amigos, colegas de trabalho; etc.

Ouvir nos mantém conectado ao mundo e a perda auditiva dificulta essa conexão. Quando a saúde auditiva está comprometida, outros problemas são desencadeados, trazendo prejuízos para a saúde geral. A perda auditiva NÃO tratada vai muito além da dificuldade de ouvir e entender a fala, comprometendo a saúde física e emocional.

Somos seres sociáveis e a dificuldade em ouvir e compreender a fala dificulta a interação com outras pessoas. A vergonha ou insegurança na comunicação leva ao isolamento social, que é um dos fatores que podem causar a depressão. Segundo a OMS (2019) o Brasil é o país mais deprimido da América Latina, sendo que 5,8% da população do país convivem com depressão. Estudos mostram que não cuidar da audição desencadeia sentimento de solidão, angústia e tristeza.

Não ouvir adequadamente exige muito esforço nas interações com outras pessoas, seja no lazer, em casa ou no trabalho. Esse esforço contínuo gera cansaço e fadiga, podendo levar a estresse e ansiedade. Além disso, o esforço repetitivo para ouvir pode causar tensão muscular significativa, ocasionando até mesmo dores de cabeça.

A saúde física é impactada pela perda de audição, que pode danificar o órgão do ouvido responsável pelo equilíbrio e controle postural. Estudos apontam que pessoas com perda auditiva são 3 vezes mais propensas de ter um histórico de quedas, que por sua vez é umas das principais causas de internação na população idosa e pode desencadear outras questões de saúde.

A perda auditiva impede que os sons cheguem adequadamente ao cérebro, diminuindo as atividades cerebrais. Hoje contamos com diversos estudos que associam a perda auditiva não tratada a demências, pois a falta de estímulo sonoro pode gerar declínio cognitivo acelerando esses processos. Um estudo realizado nos Estados Unidos pela Faculdade de Medicina johns Hopkins, aponta que a cada 10dB perdidos de audição os riscos de demência aumentam em 27%. A demência é um distúrbio que provoca perda de memória, dificuldade na atenção e raciocínio, entre outros. Quando a perda auditiva em idosos não é tratada, essas questões são mais evidentes, pois entendemos que acontece um envelhecimento natural no organismo como um todo.

A perda auditiva não tratada também gera impactos na atividade laborativa. Dificuldade de compreender a fala em reuniões, dificuldade na comunicação com clientes, equívoco da comunicação, irritabilidade no ambiente de trabalho podem atrasar promoções ou até mesmo levar a demissões.

Mediante as questões levantadas anteriormente é de extrema importância um olhar atento à audição, nossa e daqueles com os quais convivemos. Tão logo seja observada alguma dificuldade auditiva é fundamental que seja investigado, por um médico otorrinolaringologista e fonoaudiólogo. E então, iniciar o tratamento imediato. Sabemos que um tratamento precoce possibilita um melhor prognóstico, e o mesmo acontece com a audição. Protelar a busca por ajuda pode trazer prejuízos significativos na audição e qualidade de vida.

A reabilitação auditiva, com o uso de aparelho auditivo, é indicada para a maioria dos casos de perda auditiva. Estudos apontam que pessoas com perda auditiva podem se beneficiar psicologicamente e socialmente com esse tratamento e melhorar de forma significativa a qualidade de vida, tornando-se pessoas mais seguras e confiantes para ouvir e aproveitar a vida.

Agnes Daise é fonoaudióloga clínica e atua há mais de 10 anos na área de reabilitação auditiva

Deficiência auditiva no Brasil segundo o IBGE

Uma análise dos dados do IBGE sobre deficiência auditiva no Brasil

 

Quando se fala em deficiência auditiva, muitas pessoas logo imaginam uma pessoa idosa falando “hã?” Na verdade, além disso ser um brutal preconceito, também indica falta de informação. Nesse artigo, irei demonstrar que a perda auditiva atinge pessoas de diversas faixas etárias e tem avançado, de forma significativa, sobre os mais jovens. Para essa análise, irei fazer uso dos dados dos Censos Demográficos realizados a cada 10 anos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE.
O IBGE realiza, desde o ano 2000, um levantamento da população com alguma dificuldade auditiva. São informações que estão a disposição de qualquer pessoa, no site do Instituto.
Nessas operações censitárias, que são realizadas em todos os domicílios do país, os entrevistadores (recenseadores) fazem diversas perguntas, sobre os mais variados temas. No caso específico da deficiência auditiva, perguntaram se, no domicílio, havia algum morador que tinha alguma dificuldade em ouvir.
As alternativas de respostas, para essa pergunta, eram:
a) nenhuma dificuldade
b) alguma dificuldade
c) grande dificuldade
d) não consegue de modo algum
No Censo de 2000, aproximadamente 3,37% da população do país relatou apresentar algum tipo de dificuldade auditiva, enquanto que, em 2010, esse percentual evoluiu para 5,19% dos habitantes.
Em números absolutos, em 2000 havia 5.735.098 pessoas com algum tipo de limitação na audição e, em 2010, esse total saltou para 9.917.318.
Mais interessante ainda do que olharmos para os totais absolutos ou relativos, é analisarmos as faixas etárias onde estão essas pessoas que informaram sofrer com suas limitações auditivas.
Para fins puramente didáticos, separei essa população em dois grupos:
As pessoas com menos de 50 anos poderiam ser enquadradas como um público bem misto, abrangendo desde os bebês até pessoas da meia idade, mas que tem em comum, uma intimidade maior em relação ao uso dos recursos tecnológicos atuais, como o uso de smartphones, aplicativos variados e sistemas de comunicação.
Já os do segundo grupo, mais homogêneo, além de abranger parte das pessoas de meia idade, agrupa os idosos, tradicionalmente mais afastados do uso de tecnologias, embora seja um público que cada vez mais faz uso desses recursos, devido ao avanço da expectativa de vida.
De acordo com os dados dos Censos 2000, a perda auditiva estaria assim distribuida entre esses dois grupos:
Menos de 50 anos – 2.294.814 pessoas, ou 40% do total
Mais de 50 anos – 3.440.184 pessoas, ou 60% do total de pessoas com algum grau de deficiência auditiva.
Vamos ver as informações do censo 2010?
Menos de 50 anos – 3.963.719 pessoas, ou 38% do total
Mais de 50 anos – 6.023.529 pessoas, ou 62% do total que se declararam com algum tipo de perda auditiva.
Para ilustrar, montei esse gráfico:
Espere aí, mais de 40% da população com alguma dificuldade auditiva no Brasil tinha MENOS de 50 anos?
E você achando que só o vovô tinha problema de audição …
Alguém pode argumentar: bom, pelo menos, em 10 anos, a distribuição sobre as faixas etárias ficou estável, sendo as pessoas com mais de 50 anos a maioria ainda. Sim, ainda. Irei demonstrar que há uma tendência de crescimento acelerado de deficientes auditivos com MENOS de 50 anos, mesmo que o tamanho dessa população mais jovem venha caindo desde a década de 1940.
Você provavelmente já ouviu aquele lance de pirâmide etária. E já ouviu também que a base dessa pirâmide (pessoas mais jovens) têm diminuído a cada ano, enquanto que o seu pico (pessoas mais idosas), só alarga. Ou seja, já está complicado chamar isso de pirâmide. A imagem abaixo, ilustra bem isso.
São dados da população brasileira desde a década de 1940, além de uma projeção para 2060. Os créditos são do IBGE:
Veja que a participação das pessoas com MENOS de 50 anos no total da população brasileira CAIU de 85% em 2000 para 79% em 2010, conforme essa tabela abaixo:
Mas o que chama atenção é que, quando olhamos para o número de pessoas que declararam ter alguma tipo de deficiência auditiva, o percentual, ao invés de cair, sobe de 1,3% para 1,9% em relação ao total de habitantes.
Elaborei uma tabela para ilustrar isso também:
Pergunta de um milhão: porque o número de pessoas mais jovens com alguma deficiência auditiva está crescendo, mesmo o número de jovens, no total da população, apresentando queda? Aguarde os próximos capítulos…
Em tempo: o IBGE realiza o Censo demográfico a cada 10 anos desde 1940. Excepcionalmente, em 2020 não foi realizado devido a pandemia de COVID-19. O próximo será realizado em 2022, quando teremos novas informações para comparar com os levantamentos anteriores.
Fontes:
1 – Dados Censo 2000
2 – Dados Censo 2010
Sérgio Ricardo é Técnico em Informações Estatísticas do IBGE desde 2006.
É idealizador do portal Ouvindo a Vida Adoidado.